A paixão pela madeira e o desenho que salta para a concretude
A casa tinha o formato de um castelinho e era chamada por todos de “72”, o número na Praia do Flamengo. O castelinho pertencia a James Andrew, cuja irmã era casada com Fernando Mendes de Almeida, pai de Stella. Tio James teria uma enorme influência na formação de Sergio. Apaixonado por móveis e madeira, James mantinha uma marcenaria nos fundos da grande chácara que rodeava a casa. O quintal ia da Praia do Flamengo ao Catete. Nos fundos abrigava um enorme pomar “com frutas incríveis”, várias espécies de mangas, espaço para jogar futebol e correr à vontade. Ao descrever o “72”, a voz de Sergio se alegrava e os olhos brilhavam com as recordações divertidas e extremamente marcantes para ele:
“Eu não precisava frequentar a rua para me divertir. Levava os amigos para casa, jogava futebol e vivia na base da brincadeira. Tinha campo de futebol e aprendi a fazer churrasco. Amora, manga, jamelão, abacate, banana – tudo do lado de lá do portão. Tinha uma parte do quintal com uma grande porta de ferro que dava para a chácara onde ficavam as árvores frutíferas. Na fachada do castelinho tinha o escudo da família, que tinha um veado. Meu tio não fazia nada, era rico. Coronel da Guarda Nacional, foi ajudante de ordens do marechal Hermes. A marcenaria era seu hobby. No porão da casa ficavam as sobras de casas antigas que ele recolhia, entre móveis e luminárias, era uma maravilha. Coisas incríveis. E nós, crianças, éramos libertários, fazíamos uma bagunça homérica.”
“No castelinho, no porão da bagunça, era só quinquilharia, lustres velhos e muitas outras coisas. Ficava abaixo do nível da rua e quando havia ressaca, a água espirrava para dentro do porão. Em outro quarto, nos fundos do quintal, ele tinha a marcenaria. A parte de baixo era a marcenaria dele, na de cima ficavam os empregados e no último quarto tinha o meu estúdio de bagunças. Do lado, ficava o galinheiro.”
“No porão da bagunça tinha uma escada que subia para a casa. Era toda trabalhada em madeira, feita pelo tio James. Ele também gostava de inventar e fabricar cadeiras. Tinha mania de duas cores de madeira: clara e escura, peroba e jacarandá. Tudo era feito assim. No salão de jantar tinha um lambris em toda a extensão, com madeira escura e clara. Subia um metro e meio e ia até o meio da parede. Ele mandava seus marceneiros fazerem e só dava palpite. Eles eram excelentes. Para que seus marceneiros entendessem o que ele queria, ele fazia uns desenhos para mostrar sua intenção. Usava papel almaço e tinta vermelha, com pena que encaixava na caneta. Eram desenhos horrorosos, que ninguém decifrava, mas os marceneiros portugueses entendiam.”