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Sergio Rodrigues - O Brasil na ponta do lápis

Texto e pequisa: Regina Zappa

A primeira loja em Curitiba

No começo foi um sucesso. As visitas à loja eram quase um vernissage diário.



No começo foi um sucesso. As visitas à loja eram quase um vernissage diário.

Logo depois de festejar sua formatura, em 1952, Sergio se dividiu, por um tempo, entre o Rio e o trabalho em Curitiba. Tinha apartamento na capital paranaense e achava muito bom o local do escritório. Desenvolveu uma grande amizade pelos auxiliares, os colegas arquitetos e os engenheiros. Estava encarregado do Palácio das Secretarias, um edifício de 30 pavimentos. Apaixonado pelo trabalho, tinha “ideias maravilhosas”.

O trabalho ia de vento em popa, quando os arquitetos e engenheiros foram chamados para uma reunião. Nela ficaram sabendo que o dinheiro para as obras tinha acabado por causa da má safra do café naquele ano, que era uma tragédia e que o projeto não iria continuar. Sergio já tinha uma filha, Ângela, que tinha nascido no Rio de Janeiro e a família gastava muito dinheiro com viagens de uma cidade a outra.

Mas como já previra que a interrupção do trabalho podia acontecer, Sergio decidiu, nesse meio tempo, abrir uma loja de móveis, uma vez que o movimento do Centro Cívico atraía muita gente para trabalhar lá, que podia ser potencial cliente. Nessa movimentação ele havia conhecido o designer italiano Carlo Hauner, que havia ido para Curitiba para abrir uma filial de uma grande loja de móveis que tinha em São Paulo. Sergio também conhecera o decorador Julio Senna, que ambientava o Palácio do Governador. O contato com os dois abriu as portas para que ele desenvolvesse a criação de equipamentos de interior e “sua ambientação adequada à realidade brasileira”.

“Fiquei alucinado com aquilo. Ter uma ligação com alguém da Itália e fazer um trabalho mais intenso era sensacional.” Sergio e Carlo, junto com o irmão Ernesto Hauner, se tornaram sócios e mantiveram na “butique de móveis” o mesmo nome da outra de São Paulo: Móveis Artesanal. Com a diferença que, em Curitiba, era Móveis Artesanal Paranaense. Para abrir a loja com os sócios, Sergio apelou para a vó Stella, que já tinha vendido o castelinho e pôde bancar a loja do neto.

No livro sobre Sergio Rodrigues, da Icatu, André Seffrin descreve a vida em Curitiba na época em que o designer abriu sua loja: “A Curitiba do início doas anos 1950, no plano intelectual, era de Dalton Trevisan conquistando seus primeiros leitores nacionais […]. Era a Curitiba de Glauco Flores de Sá Brito, poeta, homem de teatro e de televisão, de Poty Lazzarotto e de Guido Viaro, nas artes gráficas e na pintura, de Temístocles Linhares e de Wilson Martins, vozes de uma nova crítica e de uma nova visão da história […]. Comer galinhada nos restaurantes de Santa Felicidade, macetar pinhão no inverno, temperatura abaixo de zero.” Nesse período, Sergio comprou seu primeiro automóvel, um fusca alemão, que depois levou para São Paulo.

A experiência durou um ano, de 1953 a 1954. No começo foi um sucesso. As visitas à loja eram quase um vernissage diário. Vinha gente de todo o Paraná para ver a novidade. Eram móveis tradicionais, criados por Hauner. Bem-feitos, mas tradicionais. Sergio passou a ser representante de Hauner, em Curitiba. E começou a desenhar porque já descobrira que sua paixão era criar móveis. Nesse momento, começou a desenhar mesas de jogo e mesas complementares.

Mas o projeto fracassou. Como Curitiba era uma espécie de capital do móvel de “estilo”, os curitibanos mais sofisticados preferiam comprar diretamente em São Paulo. “A loja foi uma tragédia. Seis meses depois de inaugurada com sucesso e para encantamento dos curitibanos, a loja fechou. Ninguém comprava nada. Foram seis meses de faturamento zero.”

Como já tinha uma infraestrutura pronta, Sergio decidiu abrir outra loja com amigos do Rio e de São Paulo, com móveis que haviam sobrado da Móveis Artesanal, de Hauner, e de outros designers paulistas. Era uma loja de representações. Esta foi outro fiasco. “Não vendeu nada, só deu prejuízo.”

Sergio ficou, então, na dúvida se saía de Curitiba ou continuava lá. “Lá eu tinha cartaz.” Antes de tomar a decisão foi chamado por duas empreiteiras para fazer duas construções. Ele deu seu preço, mas o empresário respondeu: “Que preço é esse que você está me pedindo? Eu entrego isso a qualquer desenhista e ele faz com o milionésimo do que você está pedindo.” E Sergio: “Então, eu disse: doutor, fica com o projeto e divirta-se.” 

Para outro projeto, o prédio de um Country Club luxuoso, Sergio preparou 12 pranchetas maravilhosas. “Na véspera do concurso, o presidente do clube, todo cheiroso, foi à minha casa meio sem jeito e disse que tinha uma notícia triste para mim. Pediu que eu não enviasse o projeto para não haver constrangimento, pois o vencedor já tinha sido escolhido e carioca não teria vez. Eu podia cobrar, mas não tinha sido estabelecido nenhum valor. Foi uma coisa muito desagradável.”

Diante disso, o jeito era deixar a cidade. Já estava em Curitiba há dois anos e meio. Sergio telefonou para Hauner:

– Estou aqui numa miséria danada, com filha, família, não tenho dinheiro nenhum para fazer coisa alguma. Você tem aí alguma coisa aí pra mim?

E Hauner:

– Pega seu material e vem para São Paulo. Eu te arranjo casa, vem para cá, fica perto de mim e trabalha comigo. Pega sua tralha e vem.

Da empreitada em Curitiba, Sergio levou apenas o fusquinha.

Capa desenhada por Sergio Rodrigues para publicação oficial do projeto Centro Cívico de Curitiba, Paraná, 1953.

Logotipo da loja Móveis Artesanal Paranaense criado pelo artista gráfico Leopold Haar para a unidade de Curitiba em 1953.

Interior da loja Móveis Artesanal Paranaense, a qual Sergio Rodrigues era sócio dos irmãos Carlo e Ernesto Hauner, em Curitiba, Paraná, 1953.

Inauguração da Loja Móveis Artesanal Paranaense em Curitiba, no ano de 1953, com presença do Conde Paolo Grasselli (à esquerda, posicionado de costas) e do designer Enesto Hauner (na extrema direita da fotografia, posicionado de frente).

Prédio em construção do Palácio das Secretarias de Estado no Centro Cívico de Curitiba, Paraná, 1953.

Vera Maria Serpa Campos, primeira esposa de Sergio Rodrigues, com Roberto (no colo), Ângela Maria (lado direito) e Adriana, na casa da bisavó paterna Ester Falcão Rodrigues, no Rio de Janeiro, na década de 1960.